Crime da Vale em Brumadinho : O Grito e o Clamor da terra e dos pobres

Publié le : 13 février 2019

Até mesmo na luz do dia
O desmando da tirania
Cada vez, fica mais forte
E nesse VALE de morte
VALE de destruição, VALE de lama
Segue soterrando vidas, em seu caminho.
Soterrando BRUMADINHO’S
SOTERRANDO MARIELLE’S
SOTERRANDO MARIANA’S
( Bertin Di Carmelia , Marabá/ Pará – 26/01/2019).

O crime ambiental ocorrido em Brumadinho, município situado na região metropolitana de Belo Horizonte, espalha pelas ruas e cidades o grito e clamor de homens e mulheres, habitantes da Casa Comum, violados em direitos. A tragédia criminosa causada pelo rompimento da barragem da mineradora Vale causou a morte de centenas de pessoas, e junto delas, suas respectivas famílias, além da degradação e devastação de povoados, rios, fauna, flora, montanhas, florestas, aquíferos, rios, patrimônios históricos e culturais.
Com o sentimento de solidariedade e partilha, eu e Luciana, juntamente com outros cinco membros da Pastoral de Rua Nacional, fizemos uma visita em Brumadinho na tarde do último domingo. Dor e agonia ao chegarmos no local em que se vê muita tristeza. Muito doloroso ver o lamaçal de rejeitos da barragem e saber quantas pessoas já encontradas ou ainda encobertas e desaparecidas, talvez sem jamais sair dali. Há um vale de Lágrimas ao deparar-se diante da situação, no olhar das pessoas que silenciadas na dor aguardam resposta e força para compreender a destruição, a lama, as vidas ceifadas. A Cidade em Luto, silêncio e tristeza é abraçada nas orações e vigílias. Na Igreja São Sebastião sempre repleta de pessoas para rezar e dar uma palavra de conforto para quem chega, encontramos o bispo Dom Vicente Ferreira que acompanha de perto o sofrimento provocado pela tragédia e não arreda o pé da igreja. Ele reza e conversa com os familiares das vítimas, faz a escuta e o diálogo do pastoreio a sentir a dor do outro. O padre derrama suas lágrimas e se apoia com os fiéis tristes e lamentosos a nos contar o grande “vazio” de uma igreja que chora a morte de ministros, cantores, catequistas... “daqueles que eram a gente daqui da nossa igreja”.
A Cidade de Brumadinho comemorou seus 80 anos no dia 17 de dezembro de 2018, sem saber que em pouco mais de um mês iria passar por tamanha tragédia. O risco se tornou real, provocado pela negligência, a ganância, o descaso da política econômica de lucros desenfreados ao favorecimento das grandes empresas mineradoras, sempre capazes de explorar, devorar e destruir, em vista do enriquecimento à custa da classe trabalhadora em nosso país.

Brumadinho é um município brasileiro no estado de Minas Gerais, Região Sudeste do país. A população estimada em 2018 era de 39. 520 habitantes. Em 2019, o dia 25 de janeiro será a memória que marca a eternidade a morte e desaparecimento de muitas pessoas nesse rompimento de barragem da empresa Vale S.A. Dos números da tragédia há 534 nomes divulgados, sendo 168 mortos confirmados – 134 identificados , 182 desaparecidos e 192 resgatados.
Neste dia Brumadinho vivenciou a maior tragédia de sua história, perda de famílias inteiras, de pessoas amigas, de pessoas que faziam parte da história desta pequena cidade, que brutalmente registrou o maior índice de morte e desaparecimento de toda sua história. É também, tempo de oração e compromisso para não esquecer Brumadinho, Mariana, O Rio Paraopeba, o Rio São Francisco... é hora de gritar os clamores da terra e da justiça nas intervenções sobre os recursos naturais para que não predominem os interesses dos grandes grupos econômicas, mas que prevaleça a dignidade humana e a defesa dos bens da criação de que VALE A VIDA !

Irmãs Solange Damião e Luciana Souza

Para nos ajudar REFLETIR segue em anexo o texto de D. Joaquim Mol, Bispo auxiliar da arquidiocese de Belo Horizonte

Mineradoras lesam a humanidade

Riquezas das Minas Gerais, seus minérios e tantas outras maravilhas, que tão generosamente nos foram dadas pelo Criador, transformaram-se em sua perdição. Minas vê, gravíssima e rapidamente, seus rios, lagos, afluentes, terras agricultáveis, comunidades e suas culturas sendo dizimadas. São cometidos crimes contra a vida humana, contra o meio ambiente e contra o direito de viver em comunidade e em família.
Na Encíclica Laudato si, o Papa Francisco nos alerta para a necessidade da urgente compreensão de que o Planeta agoniza e clama contra o mal que provocamos por causa do uso irresponsável e do abuso dos bens que Deus nele colocou.
O que foi legado ao homem para que prospere e tenha uma vida plena e a transmita às futuras gerações, a ação irrefreavelmente gananciosa e criminosa das mineradoras destrói em tão pouco tempo. Vemo-nos diante da débil regulação deste setor pelo Legislativo, eivado de pessoas financiadas por essas empresas e que são autorizadas pelo Executivo, imiscuído em múltiplos interesses nem sempre republicanos e precariamente fiscalizadas pelos órgãos que existem para isso. Soma-se a isso um Judiciário leniente, ensimesmado, caríssimo, insensível, pretensioso e divorciado do povo brasileiro. Foi assim em Mariana, pela Vale/Samarco, até hoje “na justiça” ; é assim em Brumadinho, pela Vale. Não podemos deixar que assim continue.
Não houve um acidente nessas Minas Gerais. Houve um crime ambiental e um homicídio coletivo. Uma matança de pessoas, animais e do meio ambiente. Quase mataram também a esperança, a fé, a dignidade e o amor das pessoas que sobraram, agora terrível e indescritivelmente sofridas, mas em processo curativo, em reconstrução, soerguimento, revitalização e retomada de posse de sua brava dignidade. Como não há uma empresa mineradora em abstrato, as pessoas que nela atuam e têm responsabilidade sobre esta tragédia devem ser rigorosamente punidas, para que, juntamente com a mineradora, não caiam em desgraça também os que exercem os poderes acima citados e já tão pouco acreditados. Conscientemente, as mineradoras optam, por serem mais baratos, por modelos de exploração de minério de ferro e de outros metais mais danosos ao meio ambiente e à vida humana. O lucro exorbitante, quase ilimitado, com pouco retorno à sociedade por meio do poder público, é o único critério e preside, inconsequentemente, as decisões em relação aos modelos de exploração dos recursos naturais.
Por causa dessa sede insaciável e enlouquecida por riquezas cada vez maiores, “que a traça e a ferrugem destroem e os ladrões roubam” (Mt 6,19), concentradas sempre mais nas mãos de pouquíssimas pessoas, empresas mantêm trabalhadores na pobreza a vida inteira e expostos à morte. A mineração em nosso País se tornou eticamente insustentável, calamitosa e de altíssimo risco para a vida humana e toda a vida existente em suas áreas de atuação.
A dimensão cruel e potência danosa da reincidência desses crimes nos apontam que apenas o fato de não se tratarem de um contexto de conflito armado é que os distingue de que sejam entendidos como crimes de lesa-humanidade. As práticas de seus infratores, afinal, se mostram sistemáticas, resultam da clareza dos riscos e danos de suas ações em covardes atos desumanos e contra a população civil.
Por isso mesmo, urge que as pessoas, organizações e instituições que valorizam a vida humana, que querem defender a natureza dessa progressiva e suicida destruição, se insurjam contra esse modelo de negócio que enriquece tão poucos, destruindo a vida de tantos. Do modo que se realiza, esta economia mata, repito o Papa Francisco, o maior líder humanitário do mundo atual.
É inadmissível a persistência desse modelo econômico de enriquecimento pela destruição. É impossível continuarmos aceitando que a natureza, obra-prima de Deus, seja sistematicamente destruída. E que milhares de trabalhadores, idosos e crianças, mulheres e jovens, prevalentemente os mais pobres e humildes, sejam diariamente expostos ao risco de morrer em função de uma ganância deplorável.
Precisamos, talvez como nunca antes, como nos convoca o Papa Francisco, cujo nome tem inspiração em São Francisco de Assis, “exemplo por excelência pelo cuidado com o que é frágil e a ecologia integral, vivida com alegria e autenticidade” (Laudato si), de um debate que una a todos, porque o desafio ambiental diz respeito e tem impacto sobre todos nós.
(Texto do Bispo Dom Joaquim Giovani Mol, sexta-feira, 25 de janeiro de 2019).